“Emma Woodhouse, bonita, inteligente e rica, e com uma casa confortável e bem localizada, parecia reunir as melhores bênçãos sobre sua existência e vivera até perto dos vinte e um anos em ambiente no qual havia pouquíssima aflição ou preocupação.”
Em uma de suas cartas à uma sobrinha, Austen escreveu que criaria uma personagem que ninguém mais gostaria, além dela própria. Emma Woodhouse é uma esnobe jovem da alta sociedade, caçula do cômico sr. Woodhouse, pai “afetuoso e indulgente” (e hipocondríaco), com quem vive em Hartfield. Sua irmã mais velha, Isabella, é casada com o sr. John Knightley, irmão mais novo de George Knightley, o amigo mais sincero de Emma, com quem a jovem tem muitas discussões acerca de sua mania de arranjar casamentos e de sua ingenuidade quanto ao caráter das pessoas que a cercam.
Emma é diferente das outras personagens de Austen: ela é rica. Como não pretende se casar, e para fugir do tédio de sua cidade, se diverte arranjando casamentos. O que a une às outras heroinas de Austen é sua inteligência (com exceção, talvez, de Catherine Morland, de Northanger Abbey).
As personagens centrais da história são logo apresentadas: a infortunadas senhora e senhorita Bates, falantes de sempre desejosas de agradecer a tudo que lhes é feito; o senhor Weston, viúvo com quem se casou a preceptora de Emma, Anne Weston, e que tem um filho, Frank Weston-Churchill, que mora com os tios em Yorkshire; a senhoria Harriet Smith, jovem que mora no internato da senhora Goddard, de quem nada se sabe acerca de seu parentesco. Emma logo se sente atraída pela encantadora jovem, e tenta introduzí-la na sociedade local. Harriet se torna um “projeto” para Emma, que tenta transformá-la para a sociedade, e encontrar um pretendente rico para a garota. A jovem garota está apaixonada por um fazendeiro local, o senhor Martin, mas Emma trata logo de pesuadir Harriet de que o jovem senhor Martin não é digno de se casar com ela, e apresenta uma alternativa: o senhor Elton, pároco de Hartfield. Porém, este está interessado na herança de outra jovem: a própria Emma. Porém, ao ser rejeitado, viaja à Bath, onde encontra uma pretendente, a senhorita Augusta Hawkins, que se torna o assunto principal das conversas e mexericos da cidade.
Os enredos de Austen refletem a sociedade burguesa do século 18 e 19 de qualquer país: jantares, bailes, jovens obedientes, tímidas e bem educadas, com o único desejo de se casar com um jovem rico e conseguir uma posição na alta sociedade. Emma não deseja se casar. Já possui uma elevada posição na sociedade e não precisa de um casamento para obter fortuna, e alega que somente se casaria caso se apaixonasse, contrastando com Harriet, sua pupila de origem obscura, que deseja encontrar um bom partido para lhe assegurar uma boa posição na sociedade. Suas contrapartes masculinas são o mais velho dos irmãos Knightley, George, e o pároco Philip Elton. Enquanto Knightley não demonstra inclinações românticas acerca de casamento, Elton é ambicioso e deseja se casar com alguém de fortuna.
Os romances de Jane Austen são mais do que romances de costumes. À leitora mais descuidada pode se passar por mais um romance romântico, mas, de forma sutil, Austen critica as instituições burguesas de forma bastante velada, tão velada que suas obras passam facilmente por inocentes histórias conservadoras, sobre moças em busca de casamento.
Quando li “Emma” pela primeira vez, há uns bons 10 anos, amei a história (apesar de nunca ter sido considerada romântica), adorei. Confesso que fui influenciada por uma amiga apaixonada pela Jane, e devorei (quase) todos os livros dela em pouco espaço de tempo. Sou curiosa por história, e o período em que se passam os romances de Austen (Georgiano) é um período da história britânica que, apesar de não gostar, acho curioso. Passei muitos anos romantizando os livros dela, e, ao reler “Emma“, já mais madura, tive outra impressão.
A leitura foi bem mais lenta, eu estive a ponto de abandonar o livro algumas vezes porque a Emma é uma personagem difícil demais, assim como as Bates, mas o desenvolvimento da heroína é satisfatório. Confesso que meu preferido é o sr. Knightley, que é totalmente diferente do preferido Mr. Darcy (que eu não gosto). Mas eu recomendaria o livro para quem quer que fosse, não apenas por ainda nutrir um carinho especial pela Jane e achar que todos que gostam de literatura precisam ler esse livro, mas pela ironia delicada de Jane. “Emma” demora, se arrasta e é cansativo, mas o desfecho no terceiro volume, temos uma heroína mudada, e bem diferente garota esnobe e vaidosa do primeiro volume.