“Viajar é uma forma de sonhar. Também um modo de fugir. Um velho truque para ser outro. Ou na verdade, para ser você mesmo.”
A autora é daquele tipo que logo na estreia ganha o Prêmio São Paulo de autor estreante com seu ótimo “Desnorteio” e no segundo livro, Paula Fábrio não deixa por menos nos convida ao encontro, não do outro, mas de nós mesmos. Afinal, “Um dia toparei comigo” é uma ode ao distanciamento que aproxima, como um ente querido que morreu ou viajou para longe, mas que sempre está conosco de alguma forma.
Narrado em primeira pessoa, a narradora flâneur e completamente ácida começa a viagem de Virginia, de São Paulo com destino a Madri. Uma pergunta dá início à viagem: “Quando foi a última vez que fui eu mesma?”.
Virginia é secretária de um banco estrangeiro, seu mundo no horário comercial é uma baia com inúmeras tarefas não criativas e nem instigantes, mas que servem como muralha para passar menos tempo em Itaquera, sob os olhares de repreensão da família. A vida de Virginia se resumia a onze meses de espera até p mês das férias, quando ela poderia ser ela mesma ou quem ela sempre quis, ao invés de seguir a vestimenta usual do escritório e as expectativas da família sobre seu futuro. Seu sonho era viver em Paris como Gertrude Stein ou Hemingway…porque de certa forma no imaginário geral “Paris é uma festa”.
“Ah, por que as pessoas deslumbradas precisam de aventuras? Por certo, falta-nos um pouco de malícia para detectar a ficção em que vivemos.”
Seu Olavo, pai da narradora, morreu e a viagem a Europa é uma forma de entender esse sentimento de culpa que a invade – “Faça-me o favor, por nada eu queria permanecer ali, em vista à sua velhice. Em visita ao meu futuro. A relação com os pais deveria ser menos obrigatória. E eu pensava, onde há amor em mim?”
Ao mesmo tempo que a culpa pela morte do pai e por ele ter morando um tempo na casa de repouso ocupam a mente da narradora, talvez menos do que os pensamentos no amigo que conheceram na Espanha [Luís], em Virgínia, num amar mais de um, no se ver diferente.
Um romance de tom confessional ou talvez eu tenha me identificado com texto. Um romance curto, quase uma novela mas nem por isso menos denso. Ou talvez como Valter Hugo Mae colocou em “a máquina de fazer espanhois” – “sem de conduta para que fosse possível acreditarem uns nos outros também, mais do que isso, sinto apenas angústia, a enfermeira entrou, aproximou-se de nós, perguntou, o que sente, senhor silva. e eu repeti, angústia, sinto angústia.”
“Porque viver é sublime quando não estamos pensando tanto.”
Porque amadurecer é como entrar na adolescência, um território minado de emoções e você já não sabe quem é ou foi….por isso como citei logo no início do texto é um livro sobre se perder para se encontrar.
“É ela, dona Helena, quem vem me oferecer um bolinho de chuva e adivinhar pensamentos. Examina a estante e comenta que precisa ler mais mulheres.”