O Sol É Para Todos

Por: Mariana de Ávila | Em: 11 / novembro / 2015

Sim. Assim como muitas resenhas apontam, o livro O sol é para todos continua tão atual quanto era há mais de 50 anos, época em que foi lançado. Infelizmente, isso não é algo para se comemorar. Na verdade, é bem triste perceber, após a leitura, que a intolerância racial retratada pela escritora Harper Lee ainda está tão presente na nossa sociedade.

Narrada por Jean Louise, apelidada de Scout, a história se passa na fictícia cidade de Maycomb, no estado Alabama, ao sul dos Estados Unidos. Sob o olhar de Scout, de seis anos (no início do livro), conhecemos as rotinas e costumes das pessoas que vivem em Maycomb. A pequena Scout vive com o pai(Atticus), o irmão, quatro anos mais velho (Jem), e a cozinheira (Calpúrnia).

Aos poucos, percebemos, sempre pela perspectiva da caçula da família, que as pessoas da cidade estão fazendo comentários estranhos a respeito do seu pai. Quando se referem a ele, ela percebe um tom negativo e crítico na voz dos moradores. Com o tempo, Scout entende que tudo isso tem a ver com um caso que o pai, advogado respeitado, está defendendo.

No início de 1930, Atticus é designado para defender Tom Robinson, negro acusado de estuprar uma mulher branca. A comunidade preconceituosa da cidade acha um absurdo que ele esteja ao lado de um negro e muitos se posicionam contra Atticus. Alguns colegas de escola das crianças, sabendo de toda situação, descontam em Scout e Jem os comentários racistas que escutam dos pais.

A narrativa de Harper Lee é envolvente e segue uma linguagem simples. A narração feita pela Scout é cativante e tão adorável quanto a própria menina, e nos passa uma visão, sob a perspectiva de uma criança, de uma sociedade ignorante e hipócrita, mergulhada em preconceitos injustificáveis.

A sequência narrativa no tribunal é excelente. Todos os diálogos e procedimentos jurídicos desta parte problematizam o racismo que impregnou nos Estados Unidos durante muito tempo. Entristece e envergonha perceber que situações preconceituosas ainda estão presentes, inclusive no Brasil.

Fora da ficção, não é preciso ir muito longe para constatarmos o racismo. Em maio deste ano, colegas de equipe do ginasta Arthur Nory gravaram um vídeo para uma rede social onde debocham do colega pelo simples fato de ele ser negro. No vídeo, um dos ginastas diz: “O saquinho do supermercado é branco. E o do lixo? É preto!”. Após a repercussão negativa, a equipe dos ginastas, ao lado de Arthur Nory, gravou um vídeo se desculpando e dizendo que aquilo era uma brincadeira e que as pessoas haviam entendido errado. O difícil é entender com uma atitude feia como esta pode ser considerada brincadeira.

Em julho, a jornalista Maria Júlia Coutinho foi vítima de comentários racistas no facebook. Recentemente, em outubro, a atriz Taís Araújo também precisou lidar com comentários preconceituosos em sua página no facebook. Esses casos ganharam destaque porque envolvem pessoas da mídia e do esporte. Dói pensar que situações como estas continuam acontecendo em escolas, faculdades, ambiente de trabalho e, principalmente nas redes sociais, onde preconceituosos, com uma falsa ideia de anonimato completo, se sentem mais fortes e encorajados a despejar todo tipo de comentário

Em um dos belos diálogos do livro, Jem, intrigado com o comportamento das pessoas da cidade onde vive, comenta com a irmã:

“Se só existe um tipo de gente, por que as pessoas não se entendem? Se são todos iguais, por que se esforçam para desprezar uns aos outros?”

Escrito em 1960, O Sol é para todos, editado no Brasil pela José Olympio, conquistou o Prêmio Pulitzer no ano seguinte. O livro ganhou uma adaptação homônima para o cinema, em que, além de duas outras estatuetas, venceu também a categoria de melhor roteiro adaptado.

Por fim, é notório como Harper Lee Harper Lee consegue abordar o racismo sob a delicada visão de uma criança, que, aos poucos, percebe como é hipócrita a sociedade em que vive. O livro continua atingindo altas marcas de venda, pela escrita brilhante da autora e também por trazer um tema ainda tão próximo. A grande conquista, no entanto, virá quando o livro deixar de ser atemporal e, mesmo assim, continuar com altas vendas, para que as pessoas se lembrem de que todo o preconceito abordado na história deve ser apenas um registro de um passado que não deve se repetir.

Dia 12.11 tem o Clube de leitura #leiamulheres em Brasília onde esse livro será discutido. Saiba mais.

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