Jazz

Por: Juliana Gomes | Em: 28 / setembro / 2015

“Agora aposto que você vai me contar uma história horrenda de uma garota que aprontou com você e como ele não tem culpa nenhuma porque ele só estava andando na rua, cuidando dos interesses dele, quando essa putinha pulou para cima dele e o arrastou para cama dela. Não gaste o seu fôlego. Vai precisar dele no leito de morte.”

Quando pensamos na leitura de Toni Morrison para o clube, me veio à mente uma leitura interessante, afinal, ela foi a primeira mulher negra a ganhar o prêmio Nobel de literatura e o filme Beloved já tinha me levado às lágrimas há um tempo. Mas novamente me peguei naqueles romances não lineares, musicais e com narradores diferentes construindo uma mesma história de uma maneira tão imponente e envolvente que mesmo tendo que reler n páginas para entender ou reentender os acontecimentos, esse processo foi muito valioso.

A Cidade, escrita assim em todo livro, não é mero cenário e sim personagem atuante no entendimento da necessidade de Violet em sair do interior e seguir para o lugar da esperança mesmo sem a firmeza de Joe num primeiro momento. A Cidade te coloca num gueto e mesmo lá você vai precisar se impor, relacionar-se e mostrar a que veio.

“Não há muitas aqui e, se for permitido pisar na grama aparada, a Cidade o informará. Você não escapa da trilha que a cidade traça para você.”

Essa é a história de mulheres negras batalhadoras que ao som de Trombone Blues de Duke Ellington seguiam seus destinos ou desviam dele e se refaziam da melhor maneira que podiam. Essa é a história de uma tia sem filhos que ao ser largada pelo marido, perder o irmão e cunhada traz a sobrinha Dorcas para Cidade, onde a cria até que ela conhece um homem de meia idade casado que a “aceita” como ela é. Quando é largado pela jovem, a mata. Durante o velório de Dorcas, Violet, a esposa, tenta matá-la simbolicamente sem perceber que estava apenas se culpando por não ter sido a “esposa ideal” e se sentindo culpada pela traição. Poderia ser o resumo do enredo mas você perceberá que com o passar do tempo que o livro é bem mais do que isso.

“Jazz” é um livro curto mas que põe em cheque a questão da mulher negra trabalhadora nos EUA, suas famílias e migrações para os grandes centros urbanos. Toni Morrisson nos mostra porque o feminismo vai além de uma teoria ao tocar em feridas sociais sérias e ainda abertas.

O livro vai além do triângulo amoroso Violet-Joe-Dorcas, é um romance polifônico sobre uma geração de homens e mulheres que precisam comandar famílias, sobreviver aos infortúnios do dia a dia, enfrentar o racismo com a mesma coragem que tiveram ao saírem de suas cidades. Diante de casos tão recentes de violência e mortes contra os negros, principalmente em Baltimore fica evidente como esse livro é infelizmente atual. Ou nem precisamos ir para os Estados Unidos e perceber que o preconceito acontece com os  imigrantes africanos, latinos, os adolescentes do passinho ou os que não estavam nos arrastões no Rio e apenas na praia mas por serem negros e pobres entraram no hall dos indesejáveis.

É um livro sobre grandes e pequenas violências diárias.

O encontro sobre esse livro acontece amanhã na Blooks – São Paulo.

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