A Amiga Genial

Por: Michelle Henriques | Em: 24 / agosto / 2015

Você é minha amiga genial, precisa se tornar a melhor de todos, homens e mulheres.” pág. 312

 

Elena Ferrante é um mistério desde 1992, quando publicou seu primeiro romance, “L’amore molesto” (ainda sem tradução no Brasil). Sabe-se pouco sobre a escritora, aliás, presume-se que ela seja uma mulher, pois em artigo de 2013 para o The New Yorker, o crítico James Wood escreve sobre as referências que a autora fez sobre ser mãe. Ferrante se mantém há mais de 20 anos longe dos olhares da imprensa, e apenas por conta do lançamento de sua Quadrilogia Napolitana ela começou a dar algumas entrevistas.

O primeiro volume da quadrilogia chegou há pouco no Brasil com o título de “A Amiga Genial”. A trama gira em torno da amizade entre Elena (Lenu), a narradora, e Rafaella (Lina, mas chamada de Lila apenas por Lenu), sua melhor amiga. O livro começa com o desaparecimento de Lila, já idosa, que vai embora sem deixar registro algum de sua existência. Em tom de vingança, Lenu resolve escrever a história das duas.

O enredo começa em 1948, no subúrbio de Nápoles pós-guerra. A autora não se atém apenas á relação das amigas Lila e Lenu, mas passa pela vizinhança pobre e marcada por uma violência por vezes silenciosa. Como era de se esperar pela época, os homens são os dominantes naquela sociedade e as mulheres, submissas.

Após terminarem a escola, começam os embates da amizade das duas. Lenu continua os estudos, com o apoio de alguns professores e até mesmo de Lila. Sem o mesmo privilégio, ela se dedica a trabalhar com seu pai e seu irmão, até ficar noiva de um homem e se preparar para casar. Lila sempre foi a mais ousada e criativa das amigas, mas foi a primeira a sucumbir ao papel esperado por uma mulher.

Lenu passa então a se questionar, por que ainda não tinha um namorado? Estaria ela certa em dedicar tanto tempo aos estudos? Começa então um clima sutil de competição entre as duas. Mais uma vez, tendo em vista a sociedade da época e o que era esperado das mulheres, era mais do que comum que existisse algum tipo de disputa. Ferrante traz questionamentos que até hoje estão presentes na cabeça de qualquer mulher, desde sua sexualidade até seu papel no mercado de trabalho.

Em entrevista ao site O Globo, a autora diz: “Em princípio, me pareceu que para escrever bem precisasse escrever como um homem. Apenas graças ao feminismo descobri a potência das poucas vozes femininas que conseguiram um espaço seu”. A fala de Ferrante se une ao nosso projeto de ler mais mulheres. O feminismo deu voz a essas mulheres e agora podemos ler o que elas têm a dizer, debater os temas propostos e trazer as discussões para nosso dia a dia.

Ferrante afirma que se inspirou em uma amiga de infância, já falecida, para escrever a quadrilogia, mas ela também fala de amizades entre mulheres, tanto as que ela viveu, quanto as que ela observou. Assim temos “A Amiga Genial”, livro que tem como plano de fundo a amizade, mas relata a vivência de duas jovens pobres na Itália, em uma época difícil, tanto economicamente quanto social. O clima de tensão se reveza com aquele de sutileza, indo de questões pesadas (uma experiência sexual traumática vivida por Lenu) até momentos de cumplicidade (quando Lila finalmente escreve uma carta para Lenu, que estava na praia).

É um livro sobre amizade, sobre amadurecimento e principalmente sobre o “tornar-se mulher” de duas jovens, que compartilham seus medos, anseios e que falham uma com a outra. A amizade não é um relacionamento fácil, ainda mais entre mulheres, quando se espera disputa e competição, mas a autora faz questionamentos e críticas sutis a essa condição. Uma ótima leitura e agora fica a ansiedade para que os demais livros sejam logo publicados no Brasil.

Uma curiosidade: no livro, o aniversário de Elena Greco é no dia 25 de agosto, por coincidência, dia em que acontece o #leiamulheres de São Paulo. Não deixem de comparecer.

 

Clube #leiamulheres

A Amiga genial de Elena Ferrante

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