O fim da história

Por: Juliana Gomes | Em: 10 / agosto / 2016

Lydia Davis é uma das maiores contistas da nossa época, junto com Alice Munro. Vencedora do French-American Foundation Translation Prize de 2003 por sua tradução de “No caminho de Swann”, de Marcel Proust, ela foi nomeada Chevalier da Ordem das Artes e das Letras pelo governo francês por sua obra de ficção e tradução. Venceu o Man Booker International Prize em 2013. Vive em Albany, Nova York.

“O Fim da história” é seu primeiro e único romance. Lançado nos EUA em 1995 só agora chegou ao Brasil e em 2015 na Espanha. Como disse Rodrigo Frésan, escritor argentino contemporâneo, “ler Davis, sim, te converte a cúmplice de Davis”. E é esse o sentido desse romance, porque você começa do fim e da busca por respostas do porquê desse término. Talvez você já deva ter passado por essa sensação do amor não correspondido, que você não correspondia e só quando começa a se esvair por entre seus dedos que você repara que poderia ter sido algo maior. Então você vai em busca de respostas.

A “história” de “O fim da história” é enganosamente simples. Uma narradora sem nome (que assim como Davis, trabalha como uma tradutora) olha para trás, para um caso de amor que acabou. Então, olhando para si mesma, para não deixar ir, ela tenta imprimir uma ordem sobre a sua experiência. Especificamente, ela se propõe a transformar a história do caso e suas consequências em um romance. No entanto, esta história aparentemente simples de amor e perda é mediada através de múltiplas visões.

Em primeiro lugar, há os fatos; em segundo lugar, a experiência inclinada da narradora de tais acontecimentos. Também existem os mecanismos da memória, sempre frágil e falível, com a qual esta experiência é lembrada. Finalmente, confrontamos o ato abrangente de escrita – um ato que, como Maurice Blanchot, ensaísta e crítico literário francês, diria, “questões de sua própria ausência, dirigindo-se à sombra de acontecimentos, não a sua realidade.” Mais confusa ainda, se escrita é a etapa final desta sequência, é também a primeira, uma vez que a escrita é o que torna recordação. E isso é para não falar da diferença entre o romance, a narradora que está escrevendo e quem está lendo um escrito de Lydia Davis. A escrita é uma sombra que lança sua própria sombra.

Nada como o distanciamento e a lembrança da história para até mesmo fantasiarmos e perdoarmos erros imperdoáveis tanto os nossos quanto os do outro. E a partir dessa vaga, e extremamente seletiva, lembrança que os momentos de solidão e stress assolam a personagem, seguimos sua viagem em busca da verdade. Ou melhor, da verdade que ela gostaria que fosse. E como se de alguma forma sempre sabemos o que aconteceu, apenas queremos nos certificar de que poderia ter sido diferente e como diminuir a culpa do que aconteceu por nossa causa. Lydia coloca em xeque a questão da mulher na sociedade e relacionamento com pessoas mais jovens. A culpa de como observarão essa relação e o conceito do que é certo e errado para os outros e não para você mesma.

Durante muito tempo deixei que o fim dos relacionamentos fossem de alguma forma o fim de algo dentro de mim, um agente de mudança e de culpa. Talvez seja por isso que esse livro me pegou, porque é exatamente o que a personagem busca: redenção. E o ponto final  que toda boa história merece. Não vá pelo caminho fácil da professora apaixonada pelo aluno mais novo, nem cite que ela tem problemas com álcool. Escolha o caminho difícil e não se arrependerá.

Ou como a própria autora definiu nesta entrevista :

” O fim da história ” é  seu único romance . O que a levou a escrevê-lo e por que com uma estrutura tão particular?

– Eu decidi escrever quando eu percebi que a história de amor foi tomando forma na minha cabeça. Eu já tinha escrito muito, então eu precisaria de uma estrutura diferente. Então comecei a escrever uma outra história paralela sobre uma mulher que está escrevendo um romance. Eu percebi que poderia derreter tudo em um livro. Não posso dizer porque  escolhi esta estrutura sem capítulos, apenas espaços em branco aqui e ali , a não ser que me atraiu monólogos obsessivos , sem interrupção, desde os romances de Thomas Bernhard e aparentemente interioridade naturalmente fragmentada , ” O Amante ” , Marguerite Duras, e queria escrever algo inspirado por eles .

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